Quem são esses brasileiros analfabetos residentes no DF?
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A
cada ano períodos de chuvas mais intensas, repetem-se pelo Brasil as
cenas de tragédias provocadas por enchentes e deslizamentos de terra.
Esses desastres periódicos são, muitas vezes, indevidamente atribuídos
apenas à intensidade dos fenômenos naturais. No entanto, na
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), um grupo de especialistas
no tema adota uma perspectiva mais crítica: os desastres são
recorrentes no país por falta de uma cultura de prevenção e proteção
civil.
Essa é uma das principais conclusões do livro Sociologia
dos Desastres: construção, interfaces e perspectivas no Brasil, lançado
pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais em Desastres (Neped), do
Departamento de Sociologia da UFSCar. A obra é fruto dos estudos
realizados no núcleo desde 2003 e reúne artigos de 12 especialistas
diferentes.
Organizado pela coordenadora do Neped, Norma
Valêncio, e pelos pesquisadores Mariana Siena, Victor Marchezini e
Juliano Costa Gonçalves, o livro tem o objetivo de contribuir para o
aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Defesa Civil.
De acordo
com Mariana, o foco do grupo é a relação entre desastres, direitos
humanos, defesa civil e dimensões políticas e institucionais.
“Estudamos também as dimensões psicossociais dessa associação. Para
isso, trabalhamos com entrevistas in loco, por exemplo, com moradores
que perdem suas casas em desastres”, disse Mariana à Agência FAPESP.
Sob
a orientação de Norma, a pesquisadora desenvolve atualmente, com
auxílio da FAPESP, um estudo de doutorado com o tema “Vulnerabilidade
diante dos eventos extremos relacionados às mudanças climáticas: uma
análise sociológica do discurso e prática da assistência social em
cenário de desastre associado às chuvas”.
Segundo Mariana,
praticamente todos os estudos realizados pelo Neped convergem para a
constatação de que não há, no Brasil, uma cultura relacionada à
prevenção e à proteção civil em relação a desastres. De acordo com a
pesquisadora, o caso dos desastres ocorridos recentemente em Angra dos
Reis (RJ) é um exemplo atual de uma constatação feita pelos
especialistas no livro: os órgãos públicos têm dificuldades para reagir
aos desastres.
"Se houvesse prevenção, a espacialização da
população não geraria desastres. Se há fatores que caracterizam ameaça,
é preciso preparar a população. E, após o resgate, é preciso buscar
maneiras de reabilitar a população imediatamente e fazer uma
reconstrução resiliente", disse.
A ineficiência do sistema de
defesa civil, segundo Mariana, não se resume à incapacidade de resposta
imediata. Ela é percebida especialmente no trabalho de prevenção quase
inexistente. “A falta de prevenção é generalizada e o ente público está
sistematicamente ausente. As lições aprendidas com as falhas na
prevenção quase nunca são incorporadas”, afirmou Mariana.
Sempre
os mesmos - Cerca de 25% dos municípios brasileiros são afetados por
desastres relacionados a chuvas e seca a cada ano, de acordo com dados
levantados pela equipe do Neped. Segundo Mariana, os estudos feitos
pelo grupo mostram que, nos últimos sete anos, a existência de
desastres é verificada nos mesmos estados e municípios.
“Entre
2003 e 2007, observamos em estudos de caso que os mesmos locais e as
mesmas famílias haviam sido atingidas diversas vezes. Tudo se repete
periodicamente, com as mesmas características e os mesmos prejuízos. E
eventualmente em situação pior, já que pessoas que mal tiveram tempo
para se recuperar são atingidas novamente”, afirmou.
De acordo
com Mariana, há uma estreita relação entre desigualdade social e
exposição ao risco. “Os fenômenos naturais, ainda que extremos, não são
desastres. Entendemos por desastre uma combinação da ameaça natural com
a alta vulnerabilidade. É o que temos visto no caso dos terremotos no
Haiti. O país tem grande vulnerabilidade econômica, social e
institucional dos mais diversos matizes. Quando ocorre um terremoto,
nesse caso temos de fato um desastre”, explicou.
Os estudos
constataram, segundo Mariana, que o processo de vulnerabilidade está
relacionado à indiferença social em relação ao direito de
territorialização das populações empobrecidas. “É essa indiferença e o
descomprometimento dos órgãos de defesa civil que tornam essas pessoas
vítimas fáceis dos impactos dos desastres naturais”, disse.
Embora
a vulnerabilidade tenha um componente inequívoco ligado à pobreza, a
parte mais rica da população também é afetada por desastres, de acordo
com Mariana. “Todos são atingidos. Mas quem tem mais poder aquisitivo
dispõe também de mais facilidade para suplantar essas adversidades,
reconstruir o que foi destruído e garantir a prevenção para que o
desastre não se repita”, afirmou.
Os pesquisadores do Neped,
segundo Mariana, realizaram nos últimos anos estudos dedicados aos
diferentes grupos sociais que apresentam vulnerabilidade aos desastres.
“Esses grupos são submetidos a um expressivo sofrimento social em
situações de desastre. Na maioria dos casos, essas vulnerabilidades se
combinam com políticas sociais precárias. Estudamos como os desastres
afetam as populações de baixa renda, mulheres, idosos e crianças, por
exemplo”, declarou.
Atualmente, o grupo se dedica a estudar
também a vulnerabilidade a eventos extremos associados às mudanças
climáticas globais. “O nosso núcleo tem hoje 18 profissionais de
diversas áreas, sendo que a maior parte vem da sociologia”, disse a
pesquisadora.
O livro, segundo a pesquisadora, está dividido em
quatro seções. A primeira trata de políticas institucionais da defesa
civil, a segunda aborda as dimensões sociais da vulnerabilidade e a
terceira discute o tema “Educação para redução de desastres”.
A
última seção é a única que trata de estudos feitos fora do Brasil,
abordando as pesquisas feitas por Norma Valêncio na África, nas quais
avaliou os impactos das mudanças climáticas sobre países do continente.
“Essa seção faz uma reflexão sobre a contribuição das ciências humanas
para pensar o sofrimento social no continente africano”, disse Mariana.
(Fonte: G1)