O Estado de S.Paulo

Pesquisa usa lápides para calcular tempo médio de absorção da norma


Emilio Sant’Anna escreve para “O Estado de SP”:

A professora de língua portuguesa Rita Schettini Costa abriu mão dos livros para concluir que a população leva em média uma década para se adaptar às mudanças ortográficas. Em uma visita ao túmulo dos pais, no cemitério municipal de Muriaé, na Zona da Mata mineira, ela percebeu que a ortografia dos epitáfios se manteve a mesma por um longo período após as reformas da língua portuguesa.

Rita encontrou lápides da década de 1980 onde pôde ler “Êle deixa saudades”. Assim mesmo, com acento circunflexo. Desde 1971, o pronome havia perdido o acento, mas as lápides teimaram em achá-lo.

O mesmo aconteceu com o túmulo de uma mulher falecida na década de 1930. Na lápide, era “ella” que deixava saudades para seus filhos e “paes”. “Em alguns casos, a demora para se adotar as novas normas de ortografia chegou a passar de 20 anos”, diz Rita. O trabalho se transformou na pesquisa de iniciação científica e de conclusão do curso de Letras feita pelo aluno Adalberto da Silva Alves, de 29 anos, na Faculdade Santa Marcelina. Além do cemitério de Muriaé, Adalberto também estudou as lápides da cidade vizinha, Patrocínio de Muriaé.

O aluno encontrou lápides de 1938 com a consoante “l” dobrada, como em “Orae por Elle”. Isso, sete anos após a reforma ortográfica de 1931, a primeira grande alteração feita na língua portuguesa com consenso entre Brasil e Portugal.

Antes dela, a Academia Brasileira de Letras (ABL) ensaiou uma reforma em 1907. Os portugueses, no entanto, ignoraram a iniciativa da antiga colônia e partiram eles próprios para a reforma da língua. Em 12 de setembro de 1911, Portugal adotou uma nova ortografia. Foi então a vez de os brasileiros ignorarem a iniciativa. Somente com a reforma de 1931 o País passou a adotar as alterações propostas pelos portugueses, 20 anos antes.

A mesma reforma seria ainda revogada em 1934 pela terceira Constituição brasileira. Quatro anos depois, Getúlio Vargas voltou atrás e fez valer novamente as normas de 1931.

Tantas mudanças podem ter influído na demora da adaptação das pessoas às normas ortográficas. Mas Adalberto cita mais uma razão: a pequena parcela da população que tinha acesso à educação. “Em se tratando das primeiras décadas do século passado, o acesso ao material escrito era mais escasso”, diz.

“A informação demorava mais para chegar às pessoas e a compreensão das mudanças na ortografia, também.” Esse foi o motivo que levou a professora de Adalberto a evitar a biblioteca municipal. Ali, encontraria obras de autores que conheciam as normas, mas que eram a minoria da população. “O cemitério é como um museu a céu aberto, pois os epitáfios eram escritos pelas próprias famílias”, diz.

Agora, desde o dia 1º, está em vigor, o novo acordo ortográfico, que modifica 0,5% das palavras da língua portuguesa usadas no Brasil.

Algumas mudanças

Cai o trema: consequência, tranquilo, pinguim

Ditongos ‘éi’ e ‘ói’ perdem acento: heroico, assembleia

Formas verbais com ‘eem’ não se acentuam: veem, leem

Hiato ‘oo’ perde circunflexo: povoo, voos

Cai o hífen quando a última letra do 1.º elemento e a 1.ª do último são vogais distintas: antiaéreo, infraestrutura

Usa-se hífen quando as vogais são iguais: micro-ondas

 

 

 

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Nasci no remoto ano de 1945, em São Lourenço, encantadora estação de águas no sul de Minas, aonde Manuel Bandeira e outros doentes iam veranear em busca dos bons ares e águas minerais, que lhes pudessem restituir a saúde.

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