Quando é que começamos a sentir os primeiros sinais da velhice? Quando fiz cinquenta anos, há mais de uma década, meu filho me perguntou: _ Cumé, mãe, já dá pra considerar que a senhora já chegou à meia idade?  ( ele sempre me chamou de senhora, e não fui eu que ensinei isso a ele, acho que foi de me ouvir chamar os meus pais de ‘senhor’ e ‘senhora’. Respondi:

 _ Matematicamente, não há como negar os fatos, física e psicologicamente me sinto como me sentia aos trinta anos. E, de fato, ainda me sinto uma animada balzaquiana, para usar um termo que saiu de moda , mas que se refere a Honoré de Balzac, escritor francês que escreveu em 1842 uma popular novela “A mulher de trinta anos”, naquele tempo já considerada  quase uma matrona.

Dizem os otimistas, eu com eles, que temos a idade que sentimos ter. Mas não há como negar que a natureza cobra a sua fatura.  Lá, um certo dia, a gente vai ao médico e ele diz: _ A pressão da senhora está alta, vamos ter de prescrever um remedinho. _ Como? Pressão alta? Mas eu sempre tive pressão baixa. _  Mas aí a gente se lembra da história que nos contou o colega,  de nossa idade. Ele ia bem tranquilo passeando pelas ruas de Paris quando parou numa barraca onde um serviço médico tirava a pressão dos transeuntes. Para sua surpresa, foi diagnosticado como hipertenso e assim que retornou ao Brasil iniciou um tratamento.

O médico insiste: _ Há alguém com pressão alta em sua família?

_ Meu pai e minha mãe, e pelo menos, que eu saiba, minha avó paterna.

Ele sorri e acaba de redigir a receita e o remedinho de pressão entra no nosso menu diário.

E vêm outros indícios. Você se surpreende, descendo escadas com cuidado, mãos firmes no corrimão, escolhendo sapatos de saltos mais baixos e mais seguros; controlando o peso com mais empenho, diminuindo o sal da comida.

Hoje li uma crônica de Danusa Leão, de confessados mais de setenta anos, em que ela garante sentir pelo carnaval a ojeriza que seu pai manifestava e que ela não entendia. No entanto, admite sentir saudades do tempo em que ‘pulava carnaval’, observando que era assim que se dizia antigamente.

Eu também sinto saudades dos gloriosos bailinhos de carnaval. Como uma menina bem comportada, não cheirava lança-perfume, mas a fragrância de éter pairava no ar. Nos bailinhos de carnaval de minha infância e adolescência, sempre que eu podia fugir à vigilância dos  olhos  de minha mãe, sentadinha à mesa, e atentíssima ao movimento no salão, compensava toda a repressão com que nós, moças de boas famílias mineiras, éramos criadas.  Afinal, foi pra isso que o calendário gregoriano incorporou o carnaval antes da quaresma, como uma válvula de escape das emoções contidas e reprimidas. Eram uma alegria os bailinhos de carnaval.

Será que meu desinteresse pela muvuca do carnaval aqui na Bahia é mais um sinal da idade? É possível.  Para me  consolar ouvi, mais de uma vez hoje, “My way”, com Frank Sinatra.  E bom chegar aos sessenta anos sem ter que se arrepender  de nada do  que se fez, ou do que não se fez.

 I’ve lived a life that’s full.
I’ve traveled each and ev’ry highway;
And more, much more than this,
I did it my way.

Regrets, I’ve had a few;
But then again, too few to mention.
I did what I had to do

I did it my way.

Salvador, 22 de fevereiro   de 2008

 

 

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Nasci no remoto ano de 1945, em São Lourenço, encantadora estação de águas no sul de Minas, aonde Manuel Bandeira e outros doentes iam veranear em busca dos bons ares e águas minerais, que lhes pudessem restituir a saúde.

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