Um diálogo possível
Marcelo Abreu
Se colocassem cara a cara um garoto nascido e criado em Brasília e outro, nascido e criado na região de São Luiz, no Maranhão, provavelmente eles levariam algum tempo para se entender. Mas digamos que os dois já se conhecem, falam-se com freqüência e até sabem as expressões que cada um utiliza. Seria um diálogo engraçado, a princípio estranho, absurdo para quem não está acostumado, mas possível. Bem possível:
_ E aí, pequeno, cadê tu? Pergunta o maranhense.
_ Fala aí véi. Di boa?. Responde o brasiliense.
E o diálogo prossegue. Conta, cheio de gingado, o garoto de Brasília:
_ Hoje vai ter uma parada sinistra na casa dum chegado na Sul. O bicho estuda comigo. Vamos zoar muito.
O maranhense dançador de boi e comedor de farinha d’água emenda:
_É, eu também vou numa festa lá na escadaria do Reviver. Pequeno, tu vais perder um reggae pesado. Depois vamos pra Litorânea. Vai ser bom pá poxa. Aquelas pequenas vão tá tudo lá....
Depois da parada sinistra e do reggae:
_Véi, na casa do bicho rolou um lance cabuloso. Um prego cismou comigo e eu parti a fuça dele.
_ No reggae, tinha um pequeno doidinho, aperreando todo mundo. Levou logo foi um bogue, eu mesmo ia dar-lhe...
É, o diálogo seria mais ou menos assim. Por que sei que seria assim? Porque sou maranhense e volto a São Luís todos os anos. Porque um dia falei exatamente assim. E porque conheço bem Brasília. Vivo aqui há duas décadas.
Marcelo Abreu
Correio Braziliense 3072006
Caderno Cidades