Cara colega Maria Inez e colegas da CVL,
De fato, parece-me que a relação do processo de alfabetização escolar com os métodos é uma questão para ser (re)pensada com muita sutileza para não acreditarmos que o método fônico (ou qualquer outro...) resolve uma tão questão complexa e multifacetada.
Ressolvi escrever uma réplica porque, apesar de não ter um estudo sobre o assunto ou ser especialista na questão, acredito que não é atacando o(s) construtivismo(s) e os estudos de letramento, por exemplo, que vamos conseguir alterar significativamente o rumo das coisas.
Em primeiro lugar, parece-me necessário definir o que estamos chamando ou
compreendendo por método de alfabetização. Um método específico analítico ou sintético? Um conjunto de princípios teóricos que organizam o trabalho do professor? Um conjunto de saberes práticos ou de princípios organizadores do trabalho do processo de alfabetização? Em suma: o que estamos compreendendo por método de alfabetização?
Em segundo lugar, acho que é importante assumir também que nenhum método sozinho ressolve os problemas envolvidos no ensino-aprendizagem da língua escrita. Não tenho condições de discutir com propriedade o método fônico, mas acho que ele sozinho também não funciona. Nem o método de alfabetização proposto por Paulo Freire ou qualquer outro... Como também não funcionam as classificaçãocategorizações propostas por Emília Ferreiro e Teberosky, etc. Talvez, o mais importante da nossa discussão seja levantar algo que precisa urgentemente ser feito: integrar as unidades de análise essenciais para um trabalho com alfabetização escolar (fonemas, grafemas, sílabas, palavras, sentenças, texto, por exemplo). Para isso, precisaremos com a ajuda dos professores-alfabetizadores discutir quais concepções de ensino e aprendizagem serão necessárias para unir tais unidades de forma eficaz.
O(s) construtivismo(s) e os estudos de letramento têm sido criticados aqui, mas não há uma discussão precisa e pontual sobre o que eles trazem de
(des)vantagens. Magda Soares, em um texto intitulado Letramento e alfabetização: as muitas facetas, publicado na Revista Brasileira de Educação, aponta para o risco que a interpretação de tais teorias trazem para o processo de alfabetização. Uma delas é negar ou minimizar um trabalho mais específico com a aprendizagem do código alfabético e ortográfico. No Brasil, temos um ótimo exemplo nos trabalhos de Artur Gomes de Morais. O pesquisador não precisou abandonar as contribuições do construtivismo ou dos estudos do letramento para trabalhar com questões ortográficas, por exemplo. A questão é trazer níveis de análise específicos para a sala de aula, seja através do estudo das regularidades e irregularidades ou da consciência fonológica.
Em terceiro lugar, torna-se essencial definir o nosso papel seja para pensarexperenciar como operacionalizar diversos objetos de ensino e níveis de análise no processo de alfabetização escolar ou para tentar alfabetizar uma criança em 04 ou 05 meses pelo método fônico. Por essa razão, não sei se o problema é reconhecer que algo não deu certo ou assumir que não dá para alfabetizar sem a aprendizagem formal ou não das relações entre o sistema fonológico e os sistema alfabético.
Não estou aqui defendendo as más interpretações do construtivismo, pois vários estudos (Caglari, Abaurre, Fiad, Soares, Smolka, etc.) têm demonstrado n problemas em relação aos estudos da Psicogênese da Língua Escrita, do método experimental baseado nos estudos de Piaget, etc. Por outro lado, não acho que podemos ir caçar as bruxas ou defender um ´método salvador da Pátria sem ter uma idéia das causas e das conseqüências dos problemas que estamos enfrentando.
Nos cursos de formação de que tenho participado com professores alfabetizadores, a questão que parece-me mais saliente não é como ensinar a decodificar (isso os professores fazem com os princípios teórico-procedimentais do método global de contos, fônico, do silábico, do alfabético, da palavração, sentenciação, etc.), mas é como ir além... O método fônico pode ser uma tentativa, mas ele não resolve tudo. Não teríamos que admitir isso também? Trabalhar com o método fônico sem discutir os avanços da Sociolingüística no Brasil, nos últimos 30 anos, não é um problema também? Vamos negar os trabalhos que falam da importância da interação para o processo de ensino-aprendizagem (como os da Cook-Gumperz) em detrimento de um método puro?
Em quarto lugar, parece-me afirmar que é necessário uma discussão urgente sobre as metodologias e formas de dar continuidade ao processo de alfabetização nas escolas, mas acho que não podemos correr o risco de achar que um método resolverá todos os problemas ou que há um método que funciona para muitos e outros para poucos... Os próprios alfabetizadores não têm, muitas vezes, consciência dos métodos e dos princípios procedimentais que adotam [ensino direto, ensino indireto, sistematização de determinados objetos, não sistematização de outros]. Por isso, parece-me necessário uma maior divulgação das pesquisas sobre essa problemática que estão sendo realizadas em universidades como a UFPE e a UFMG, por exemplo. Um bom momento, então, para nos dedicarmos a pesquisas interdisciplinares e perceber a carência de tais reflexões nos cursos de Letras e Pedagogia.
Um abraço,
Clecio Bunzen