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CORRENTES DA SOCIOLINGUÍSTICA, ESTÁGIOS FORMATIVOS E ESCOPOS

Stella Maris Bortoni-Ricardo (UnB)

No mundo atual, a convivência entre os diferentes é questão de primordial relevância. Nunca, na história da humanidade houve tanto contato entre grupos distintos, entre pessoas diferentes. Esse contato se dá pela facilidade de transporte: terrestres, marítimos e aéreos – e é ampliado a níveis inimagináveis pelos recursos eletrônicos de comunicação, como o cinema, a televisão transmitida por satélites, e sobretudo com o advento da internet. Amplia-se o contato também pela maior permeabilidade entre estamentos sociais, promovida pela educação universal.Podemos dizer que a palavra chave da sociedade contemporânea é contato. Nessas circunstâncias a Sociolinguística tornou-se uma disciplina central pela sua própria natureza., porque desde o seu surgimento, tem como principal objetivo descrever e entender as diferenças entre as pessoas, sejam elas diferenças linguísticas, sejam culturais, étnicas ou sociais.

Ao estudar as diferenças nos modos de falar de grupos em contato, a Sociolinguística fornece as condições para que os ethos dos grupos sejam mutuamente conhecidos. Mas o tratamento sociolinguístico vai ainda além, quando propõe um contato culturalmente sensível, ou seja, ao contatar os seus próximos, o indivíduo interessa-se pelas sua crenças e culturas. Passa a conhecê-las e a respeitá-las. Esse contato culturalmente sensível é exatamente a postura que pode prevenir o conflito.

A Europa é o continente onde as diferenças linguísticas mais se destacam, pois elas simbolizam também diferenças sociopolíticas. Ali muitas línguas passaram, desde o século XIX, por processos de estandardização, mas preservaram seus dialetos regionais, símbolos quase sempre de diferenças étnicas e culturais. Nos continentes asiático e africano há também intenso contato de línguas bem como línguas que resultaram desse contato, que são os os pidgins e os crioulos.

A colonização das Américas, a partir do século XVI transferiu para o Novo Mundo o multilinguismo europeu, que se enriqueceu com o contato com as muitas línguas aborígines e língua africanas para cá transplantadas.

Os primeiros estudos sistemáticos do contato linguístico surgiram com Uriel Weinreich em 1953 e desde então têm-se expandido no âmbito da Sociolinguística.

A Revolução Francesa em 1789, ao defender a igualdade entre grupos sociais, criou as bases para o contato na democracia moderna. Não há fraternidade, igualdade e liberdade, devemos sempre frisar, se não houver respeito pelas diferenças culturais e linguísticas de cada povo e de cada grupo. Neste texto vamos recordar os pressupostos que deram origem à Sociolinguística e verificar como essa disciplina surgiu no mundo para tornar viável a convivência pacífica dos que são originalmente diferentes. Vem atuando também para demonstrar como se estabelece uma cultura hegemônica, atribuindo a essa cultura hegemônica a responsabilidade de facilitar a ascensão social e o bem-estar de todos, hegemônicos ou minoritários.

A Sociolinguística costuma ser definida como um ramo interdisciplinar nos estudos da linguagem. Para entendermos onde repousa essa interdisciplinaridade vamos remontar sucintamente a suas raízes e discutir as subáreas que se abrigam sob a denominação Sociolinguística. Analisaremos também a relevância da disciplina no rol das Ciências Humanas no mundo contemporâneo. 

Em meados do século XX, muitos estudiosos de Linguística na Europa, palco de duas guerras mundiais, fixaram residência nos Estados Unidos. Eram pesquisadores renomados, com formação advinda da linguística saussuriana e do Círculo Linguístico de Praga. Uma vez no continente americano, foram confrontados com duas relevantes questões. A primeira resultava da comparação com faziam entre suas línguas nacionais ou maternas e as múltiplas línguas ameríndias encontradas nos territórios atuais do Canadá, Estados Unidos e México. Estas últimas eram usadas por populações muito distintas das europeias e em muitos aspectos, principalmente na amplitude lexical, diferiam daquelas que os cientistas tomavam como referência, incluindo aí línguas mortas como o latim e o grego. Perguntavam-se, então, esses linguistas, se as línguas com que iam-se defrontando estariam em um estágio inferior de desenvolvimento. Foi o antropólogo Franz Boas [*1858,+1942] quem primeiro forneceu uma resposta a esse dilema, ao postular o conceito de relativismo cultural. Qualquer língua usada em uma comunidade de fala atende perfeitamente às necessidades comunicativas de seus membros, afirmou. Não há línguas naturais primitivas no sentido de exigirem dos falantes que recorram a gestos ou outros expedientes para se fazerem entender (excluindo-se, naturalmente, as línguas de sinais). Se as necessidades comunicativas da comunidade se diversificarem, seja pelo contato com outros grupos seja por outros motivos sócio-históricos, sua língua terá condições de ajustar-se às novas circunstâncias, ampliando seu léxico e diversificando sua morfossintaxe.

Essa noção de relativismo cultural, que os estruturalistas pioneiros aplicaram às diferentes línguas, foi depois (por volta de 1960) aplicada pelos sociolinguistas às variedades no interior das línguas, ou seja, aos dialetos de cada língua.

Outra questão importante para os pioneiros naqueles tempos de colonização decorria de sua própria formação estruturalista. O estudo de qualquer código linguístico àquela altura desconsiderava os usos desse código por seus falantes, que, segundo a dicotomia de Saussure, pertenciam à província da fala. Era no campo da língua, onde tudo são oposições, que as análises se processavam. Tal artifício metodológico permitiu um grande refinamento nas descrições teóricas, que, todavia, se provaram insuficientes à luz dos resultados da dialetologia, ou geografia linguística, trabalho que ia tomando corpo, inicialmente na Europa, depois na América, e registrando muita heterogeneidade quando comparados os modos de falar em cada aldeia, em cada região isolada. Um desses dialetólogos, radicado nos Estados Unidos, Uriel Weinreich {*1926,+1967]  e seus discípulos começaram e se perguntar, então, se não seria possível desenvolver uma dialetologia rigorosamente estruturalista. Seu aluno, William Labov, conciliou tal reflexão com a pesquisa dialetológico de campo em comunidades: na ilha de Martha’s Vineyard e em bairros urbanos em Nova York.

O trabalho de Labov e de seus contemporâneos, em Washington DC, que deu início à Sociolinguística, tinha como pressupostos o relativismo cultural e a constatação de que toda língua natural é heterogênea. Diante deles havia o desafio de tentar explicar essa heterogeneidade inerente e sistemática, bem como de entender por que crianças de minorias étnicas tinham desempenho escolar muito inferior ao das crianças dos grupos não-minoritários de maior prestígio. Surgiu daí uma metodologia sociolinguística que se valia da descrição de fatores linguísticos, particularmente os fonológicos, e fatores étnicos e sociais para explicar a variação na língua. A partir da década de 1970, essa metodologia passou a incorporar sofisticados tratamentos estatísticos, em que os fenômenos linguísticos em variação, a serem explicados, eram as variáveis dependentes e os fatores postulados, as variáveis independentes (de explicação ou antecedentes). Esse modelo quantitativo recebeu nome de Sociolinguística Corrrelacional e é ainda hegemônico na área.

Paralelamente ao desenvolvimento do modelo de raízes positivistas, outros campos foram criados na disciplina apoiando-se em modelos qualitativos e interpretativistas, associados à etnografia da fala, com Dell Hymes [*1927,+2009], John Gumperz [*1922,+2013] e outros.

Expandiu-se assim a Sociolinguística e, a exemplo da Sociologia, disciplina mais tradicional, suas diversas subáreas foram classificadas em dois grupos: 1. pesquisas de natureza macro (acolhendo temas como multilinguismo, bilinguismo _ inclusive pidgins e línguas crioulas _, diglossia, planejamento, atitudes e estandardização das línguas e 2. pesquisas de natureza micro, que se ocupa da variação e mudança, do discurso, da interação entre pessoas e da pragmática linguística. Essa divisão também é referida como Sociolinguística da Sociedade e Sociolinguística da Língua.

No Brasil, ambas as tendências estão muito bem representadas. Observe-se ainda que mesmo linguistas brasileiros, teóricos e aplicados, que não se intitulam sociolinguistas, valem-se de alguns dos princípios da disciplina na análise do Português brasileiro e dos nossos seriíssimos problemas educacionais. Brasília, 20 de maio de 2016

Para concluir, não se pode esquecer que os sociolinguistas pioneiros, liderados por William Labov, também demonstraram que o mau desempenho escolar de crianças oriundas de grupos minoritários decorre de um duplo desconhecimento. Essas crianças desconhecem os valores da cultura letrada vigentes na escola. Essa, por sua vez, desconhece os modos de falar, de construir narrativas e raciocínios lógicos das crianças. Tal avanço da Sociolinguística tem tido grande influência no Brasil e resultado em pesquisas e livros relevantes, que alertam para preconceitos sociais e profecias auto-realizáveis, que poderíamos chamar, hoje em dia, de 'profiling'. 28 de maio de 2016

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Nasci no remoto ano de 1945, em São Lourenço, encantadora estação de águas no sul de Minas, aonde Manuel Bandeira e outros doentes iam veranear em busca dos bons ares e águas minerais, que lhes pudessem restituir a saúde.

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