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Enviou-me a Parábola Editorial  sugestão de que eu escrevesse sobre curiosidades  de Variação Linguística.   O tema é oportuno porque o Brasil é a nação onde o modelo epistemológico e metodológico da variação linguística alcançou o mais amplo desenvolvimento, se considerarmos todos os países em que a língua ou línguas nacionais têm sido objeto desses estudos .

Quem me afirmou isso foi William Labov, e essa para mim já é a primeira importante curiosidade sobre o tema.  No início da década de 1990, eu  havia recentemente retornado de um estágio de pós-doutorado na Universidade da Pensilvânia, onde William Labov leciona há muito tempo, quando fui prazerosamente surpreendida com um amável convite de colegas linguistas da UFRJ, para que eu fosse ao Rio de Janeiro encontrar-me justamente com o Professor Labov. O convite partiu da saudosa amiga Alzira Tavares de Macedo,  linguista do Departamento de Linguística e Filologia da Faculdade de Letras da UFRJ.

Na oportunidade, conversando com o Professor Labov, ele me disse que o modelo analítico que ficou conhecido como Teoria da Variação desenvolveu-se mais no Brasil do que em qualquer outro país , inclusive em seu país de origem, os Estados Unidos  da América.  Surpreendeu-se também ele porque todos os pesquisadores que  conheceu  na UFRJ trabalhavam com o modelo.

Sendo o Brasil  um país periférico, por muitas razões, em especial pela

condição do pouco avanço de teorias científicas  por aqui, a introdução da  Sociolinguística Variacionista  deu-se circunstancialmente,  quase na mesma época em que estava sendo apresentada à Sociedade Americana de Linguística .

Veio ao Rio de Janeiro , então, o jovem linguista Gregory Guy , que apresentou o modelo ao Professor Anthony Julius Naro, à época já conhecido gerativista. Foi a primeira semente. Muitos alunos e colegas de Naro formaram com ele um núcleo voltado aos estudos variacionistas. O trabalho de 1992,  organizado por  Maria Cecília Mollica,   “Introdução à Sociolinguística Variacionista” ( Cadernos Didáticos UFRJ), de responsabilidade da própria  universidade,  menciona um conjunto de pioneiros, cujos nomes convém  lembrar  aqui : além da organizadora, incluíram relatos de pesquisa no caderno : Alzira Tavares Macedo, Anthony J. Naro, Cláudia Nívia Roncarati de Souza, Giselle Machline de Oliveira e Silva, Maria da Conceição Paiva, Maria Luiza Braga, Maria Marta Pereira Scherre, Nelize Pines Omena, Sebastião Votre  e Vera Lúcia Paredes da Silva.

 

Enquanto isso acontecia no Rio de Janeiro, um jovem pesquisador  mineiro, que havia sido introduzido à disciplina de Sociolinguística  em seu curso de graduação na UnB e prosseguido com esse interesse na UFPE e na USP,  Marcos Bagno, publicou em uma série  da editora Edições Loyola,   um livro muito honesto, com  membros de sua família na capa,  que se tornou um marco : “Preconceito Linguístico -  o que é , como se faz”.  O  pequeno livro teve grande aceitação  e em pouco tempo em todos os cursos de Letras no país, as pessoas falavam de preconceito linguístico.

Considero que tenha sido muito relevante trazer essa questão à consideração dos especialistas, pois pela primeira vez no Brasil se falava claramente da possibilidade de pessoas de baixa renda e pouca escolaridade serem  preteridas na vida social e profissional  em consequência de seus modos de falar.  Mas como sói acontecer ( como diria um autor mais erudito ) o livro teve leituras equivocadas e muitos acreditaram que a Sociolinguística Variacionista havia surgido para contrapor-se à gramática normativa. Lembro-me de um encontro com o eminente  Professor Evanildo Bechara em que ele se queixou disso para mim.

Generalizou-se   também a ideia de  que nenhum professor deveria corrigir um aluno que cometesse erros apontados pela gramática normativa, sob pena de criar no “infrator” uma  insegurança que o prejudicaria  para sempre ( !?!?)  Essa ideia é  muito estapafúrdia  porque vai de encontro justamente à própria essência do magistério.  Se o professor, ou professora naturalmente, não pode ensinar, quem deveria fazê-lo.? Mas ela se enraizou  em mentes brasileiras e creio que só veio a ser dirimida quando dois linguistas,

o próprio Marcos Bagno e Ataliba de Castilho publicaram duas importantes gramática do Português contemporâneo. A de Bagno, “Gramática Pedagógica do Português Brasileiro (Parábola, 2011) e a de

Castilho : “ Nova Gramática do Português Brasileiro”(Contexto, 2010). Ambos incorporaram informações  de cunho variacionista ao trato de cada capítulo gramatical.  Fico também feliz de ter ajudado a desfazer o equívoco quando me associei a um grupo de colegas da UnB e organizamos o livro “Por que a escola não ensina gramática assim? “(  Parábola,

2016).

Antes de avançarmos estas reflexões  sobre  a pujança dos estudos sociolinguísticos no Brasil,  é de justiça fazer duas observações.  A primeira refere-se à importância das raízes dialetológicas para o desenvolvimento da  Sociolinguística Variacionista.  De fato isso também aconteceu nos Estados Unidos. O primeiro trabalho de  Sociolinguística Variacionista foi a  pesquisa dialetológica conduzida em 1962, como tese de mestrado do jovem William Labov, sob a orientação de Uriel Weinreich , na ilha situada no litoral de Massachussets, Martha’s Vineyard . Também no Brasil, pesquisadores já familiarizados com a proposta epistemológica da Dialetologia  aceitaram rapidamente  a metodologia laboviana  para os estudos das línguas como novos recursos para implementar o  estudo dialetológico, particularmente aqueles devotados a comunidades urbanas e complexas.

A segunda observação refere-se à influência de Fernando Tarallo. Esse pesquisador, na década de 1990, defendeu uma tese de variação  sobre estratégias de relativização, na Universidade da Pensilvânia, sob a influência de Gillian Sankoff e  William Labov.  Voltando ao Brasil, publicou um livro sobre  a metodologia variacionista : “A Pesquisa Sociolinguística”( Ática, 1985),  que tem ajudado muitos pesquisadores noviços a organizar a metodologia de suas pesquisas,

O Português do Brasil de fato fornece muito material de interesse ao estudioso de Sociolinguística Variacionista.

Vejamos algumas dessas peculiaridades. Em geral, as línguas europeias transplantadas para áreas colonizadas, em contato com as línguas aborígines, deram origem aos crioulos.  No Brasil não há, de fato, registros convincentes da emergência de uma língua crioula nos séculos de colonização  . Serafim da Silva Neto, todavia, já em 1950, associava  as diferenças entre a língua portuguesa no Brasil e na metrópole a um semi-crioulo” que teria  surgido aqui.  Contemporaneamente,  essa questão tem sido aprofundada por Dante Lucchesi.

Outra peculiaridade que convém  referir é que , diferentemente de países vizinhos nossos, como Paraguai e Bolívia,  não temos no Brasil extensas áreas bilíngues, o que provavelmente se explica porque os indígenas que viviam no Brasil pertenciam a muitas ramificações do grupo tupi-guarani e falavam línguas distintas.

Em relação ao papel da Sociolinguística  Variacionista na questão educacional,  é preciso  ponderar que somente algumas regras variáveis, já estudadas nesse campo da Linguística, são identificadas pelos professores do ensino básico.  Quase sempre são aquelas que recebem maior sanção social e estão referidas pelos  autores mais conservadores , aparecendo  em livros didáticos.  Não se pode esquecer, contudo, que  a sociedade brasileira   valoriza muito a chamada correção gramatical, tradicionalmente  valorizada pela intelligentsia  nacional.  A própria imprensa, ecoando essa tendência , costuma ser muito conservadora  quando discute a questão.  De fato há pouca compreensão da genuína  postura  da Sociolinguística Variacionista, que ainda sofre muitas críticas  descabidas.

Por fim, desejo consignar aqui que essas reflexões  são rápidas e superficiais.  Não  há espaço para uma análise mais abrangente. Remeto , pois , o leitor às muitas obras recentes publicadas no Brasil ,  dedicadas  à temática sociolinguística.

 

Brasília, DF,  9 de dezembro de 2016.

 

 

 

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Nasci no remoto ano de 1945, em São Lourenço, encantadora estação de águas no sul de Minas, aonde Manuel Bandeira e outros doentes iam veranear em busca dos bons ares e águas minerais, que lhes pudessem restituir a saúde.

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